9.4.08

Aqui não jaz will

A maioria da galera na sala contava a dedo quantos dias na semana, no máximo, Dayse vinha assistir aula: dois. Semana passada ela não veio nenhum, e como não mandou muitas notícias pra mim, eu sempre dizia a todos que só podia ser frescura dela. Mas na verdade a bixinha estava com infecção urinária e quase morria. Ai ela falou:
- Will, quase que eu morria, já pensou se eu morresse?
- O que é que tem?
- O que é que tem? Eu adoro minha vida, e apesar de todos os problemas, ainda quero viver muito tempo!
Nesse momento, essas palavras não tiveram muito impacto sobre mim. Só achei interessante o fato de uma pessoa quase lascada (por outros motivos também) pensar tão bem da vida. Após isso, o restante da aula transcorreu normalmente, e logo fui pra casa. Quando cheguei, fiz o que tinha que fazer antes de me deitar, e lá no meu quarto liguei o ventilador, passei hidratante nas mãos e li um capitulo de Quando Nietzsche Chorou. Ao fazer tudo isso, desliguei a luz e finalmente me deitei, feliz e satisfeito com o desenrolar do enredo do livro. De repente, percebo que passou-se 1 hora e nada de eu dormir. Não ousei olhar o relógio do celular, mas deve ter passado 2 horas e nada de dormir de novo. Será que se eu ficar de bruços vai melhorar? Tentei, mas não adiantou. Então energeticamente acordado, tentei identificar qual o motivo pra essa insônia. Primeiro eu supus que era por causa de uma prova chata que tinha feito no dia, mas logo descartei essa hipótese, porque já fiz piores e dormia como uma pedra após elas. Descartada a suposição. Em seguida pensei que minha cabeça poderia estar muito cheia de pensamentos, inclusive sobre Nietzsche, e que eu precisava esvaziá-la. Nada a ver. Daí se passaram alguns minutos e eu me dei conta do que realmente era: meu corpo estava totalmente dolorido e pesado, principalmente as pernas e abdômen, além de uma náusea terrível, vindo da barriga até a cabeça. Aliás, esta última também doía. Esse diagnóstico poderia ser gripe ou uma dengue filha da mãe, que estaria vindo em péssima hora, visto que na próxima semana tem um monte de prova. Mas e se fosse a hemorrágica? Me levantei pra fazer o teste do Prof. Drauzio Varela, mas não tinha a mínima idéia de como proceder e voltei a me deitar. E pensei de novo: e se for a hemorrágica? Tentei ver se eu estava com febre, mas não sou muito bom em medi-la. Apesar do frio, acho que não estava. Pra piorar a situação, me veio uma dor horrível na nuca: Meu Deus! É Meningite! Ufa, o queixo está encostando no meu peito. Então o que eram esses sintomas afinal? Fui ao extremo e sugeri que fosse leucemia ou algum outro tipo de doença grave. Imagina...
Não tenho problemas quanto a ficar inventando doenças pra mim, mas naquele momento eu estava tão sensível quanto a possibilidade de bater as botas. Foi aí que recebi um choque de realidade. Hoje estaria começando minha peregrinação aos céus? Essa situação me desesperou, porque me senti desarmado e com as mãos e pés atados. Percebi que ficaria impotente diante de uma doença, só esperando ela me devorar aos poucos, sem poder fazer absolutamente nada. Ela brinca com conosco bem diante dos nossos olhos. Só aceitar. Puts! Mas eu tenho tanta coisa pra fazer ainda. Tantos planos, metas, brincadeiras, diversões, experiências, sentimentos à sentir, coisas à fazer, sorrisos pra ver. O suicida potencial é aquele que não tem objetivos a curto prazo, muitos menos a longo prazo. Há uns anos atrás eu era um, sem nenhuma perspectiva e razão de vida. Mas agora, o que me fez mudar? Por que sinto desespero dessa vez, ao pactuar do mesmo raciocínio de Dayse? Se esses meus pensamentos tivessem surgido num recente passado obscuro da minha vida, eu me sentiria aliviado e normal. Mas porque agora é diferente e eu estou tentando fugir da possibilidade de ganhar uma lápide? Lembro que naqueles tempos medonhos, minha mãe fez bolinhos de Iame pra mim com trigo vencido, e na mesma noite quase que eu morria sem ar, aliado à outras dores. Mas agi naturalmente, pra mim tanto fazia como tanto faria. Por qual motivo hoje eu quero respirar mais um pouquinho? Indiscutivelmente, a primeira resposta que me veio à cabeça para essa pergunta foi o fato de tantas pessoas especiais estarem na minha vida. Simplesmente, sem pedir, me deram um sentido. Sinto a necessidade de vê-las sorrir mais um pouco, e compartilhar gargalhadas com elas. Das que conheci aos 4 anos até hoje, estou as vendo com outros olhos. Meu deus. Como algumas pessoas são importantes pra mim. Adoro =)
Esses devaneios só poderiam ter acontecido à noite. Eu sei que a noite é uma criança, mas a criança também tem medo do escuro. É que pode haver monstros debaixo da cama.

Um comentário:

Brasnetto disse...

Poxa!!! Adorei o post, mas é verdade o que sua amiga falou, apesar dos problemas a vida merece ser vivida a cada segundo. No final das contas sempre é bom viver. Poxa, trigo vencido?! HAHAHA...

Abraço!!!