Vejo claramente um menino de blusa verde sentado no chão da facul com as havaianas roxas fora dos pés e lendo uma revista com cara de pseudo cult. Ele deve estar utilizando aquela revista como cano de escape para os problemas de relacionamentos que vem tendo com as pessoas. Também optou pelo silêncio como forma de defesa, preferindo isolar-se das ameaças que vêm sentindo do mundo inteiro. Seu nome é will, faz publicidade e tem 20 aninhos.
É exatamente assim que aquela pessoa que acabou de passar a 2 metros de mim me vê. Eu sei disso porque, recentemente, descobri que posso fazer a mágica de me desprender do meu corpo e encarnar em outra pessoa. Esse outro é capaz de visualizar o contexto em que me encontro, de forma nítida e panorâmica.
Ontem li algo muito interessante na SUPER INTERESSANTE, que me permitiu ligar essa situação com a timidez. Ó:
Medo de passar vergonha em público, de falar algo errado, de virar motivo de chacota, de se expor. De tão preocupados que são com a opinião alheia, acabam desenvolvendo um jeito estranho de se portar. É como se a todo o momento assistissem a um filme da própria vida na cabeça. Cada movimento e cada fala são ensaiados mentalmente, para que na hora que o mundo diga "ação" ele possa representar seu papel com perfeição. Tudo para evitar gafes. O tímido é um fingidor - finge tão completamente que dificilmente age com espontaneidade. E, nessa vida premeditada, acha que todo mundo repara nele também. Com todas as ações voltadas ficticiamente para ele, imagina que tudo conspira para dar errado, numa mistura estranha de narcisismo, insegurança e pessimismo. É aí que o tímido se cala.
A minha timidez chega a esse ponto. Será que esse negócio de me enxergar claramente é o extremo da dissimulação causada por ela? Não sei. Agir assim é meio paranoico. Agora mesmo enxergo alguém sentado na frente de um computador, roendo unhas, com beirut tocando nos fones de ouvido, com ressaca moral e aflito por um medo latente de amar. Que coisa louca. Em outro dia da semana vi um menino na biblioteca, que escreveu uma promessa num papel, rasgou o pedaço no qual estava escrita, amassou e engoliu, suplicando para que seu corpo digerisse aquele desejo de agir com naturalidade com as pessoas.
Eu lembro que um dos meus maiores desejos quando criança era me colocar no lugar de outra pessoa. Transferir pra mim os seus sentidos pra eu sentir suas dores e seus gemidos. Hoje, talvez eu esteja até conseguindo fazer mais ou menos isso. Com exceção de certas pessoas que eu nem sequer consigo entender o que seus lábios declamam pra mim. Ah céus! eu daria tudo pra saber o que se passa na cabeça delas! Talvez eu escreva esse pedido em vários papeizinhos e engula todos.